O Menino e o Helicóptero

Aconteceu em Itaquera, subúrbio da Central do Brasil, lá pelos idos de 1969.



O acontecido ficou famoso na época, porém, como tudo que acontecia nestes anos, fora pouco divulgado pelos meios de comunicação que vivia o auge da censura imposta pelo governo militar. 



O caso que agora vou narrar não tem nada de fantástico quando conhecido em detalhes, porém a primeira vista parece ser algo impossível. 


Um menino derrubou um helicóptero com uma pedrada.


Itaquera, hoje um dos bairros mais populosos de São Paulo, era um lugar habitado por famílias tradicionais, quase todos proprietários de suas casas simples, modestas, com grandes quintais. A Estrada de Ferro Central do Brasil cortava todo o bairro de ponta a ponta, dividindo-o em dois, do lado de lá da linha do trem e do lado de cá da linha do trem.

Mapa da Capital São Paulo - Bairro de Itaquera em destaque


Todos os bairros, naquele tempo, possuíam vários campos de futebol de várzea sendo que em Itaquera o principal, na opinião da maioria, era o campo do Elite, eu digo na opinião da maioria pois para mim o melhor time da região sempre foi e sempre será o Falcão do Morro.




Pois bem, era no campo do Elite que diariamente o helicóptero do Bradesco pousava e decolava levando e trazendo os malotes. Dizem que isto fazia parte de um esquema de segurança contra os revolucionários que estavam roubando bancos para obterem recursos.




O campo do Elite ficava bem ao lado da linha do trem, do lado de cá, porém num plano mais baixo, talvez uns trinta metros abaixo do nível da linha.


Naquele dia o helicóptero chegou no horário normal, era pontual, o pessoal costumava acertar o relógio ao ouvir o ronco do aparelho; pousava regularmente às quatro horas da tarde, e lá no centro do gramado (gramado é força de expressão o campo era de terrão vermelho) sempre estava o Jaimão, português, caixa do Bradesco, acompanhado dos seguranças e com os malotes.



Jaimão entregou os malotes ao piloto, que por obra do Divino, naquele dia veio sozinho, sem o co-piloto que normalmente o acompanhava.



Malotes embarcados, o aparelho iniciou sua tradicional manobra de decolagem, ligou os motores e subiu dando uma volta de cento e oitenta graus, ou seja, ficou de rabo para a linha do trem e de frente para o rio (bem era mais um córrego do que um rio). Subiu aproximadamente uns 40 metros, encontrando-se mais ou menos a dez metros acima da linha do trem quando aconteceu.


Cebolinha, apelido do Carlinhos irmão mais novo do Trico, estava andando pelos trilhos e aos seus pés existia uma fartura de munição, as pedras de britas onde os dormentes (toras de madeira onde os trilhos são fixados) eram apoiados. Cebolinha não tinha mais do que doze anos, menino fraco e subnutrido, um dos maiores capetas do Morro do Falcão. Ele não hesitou. Apanhou uma pedra e com a pontaria certeira atirou no helicóptero.



A pedra atingiu a hélice traseira que dá a direção ao aparelho, e com toda a potência dessa hélice a pedra foi atirada contra a cabine de comando atravessando o vidro de lado a lado na altura de onde estaria a cabeça do co-piloto.




Quem viu pode contar que o bicho após ser alvejado mais parecia uma libélula embriagada, deu umas quatro ou cinco voltas em torno do eixo e caiu como um pássaro alvejado no centro do campo.




Quando aconteceu apenas o Jaimão sabia que tinha sido o Cebolinha, pois ao contemplar a subida do helicóptero pode ver o momento exato do arremesso certeiro. 




O helicóptero ficou no campo por mais ou menos uma semana e foi a principal atração turística da história de Itaquera. Foi finalmente desmontado e transportado de carreta. Após o ocorrido nunca mais um helicóptero pousou no campo do Elite que hoje não mais existe.




Cebolinha sumiu de Itaquera. Vim encontrá-lo já adulto e fiquei feliz em saber que ele nunca foi punido por tal proeza.



Por Marcos Falcon http://bit.ly/9dMdi5

Comentários

  1. Guilherme parabéns pela ilustração.

    Encontrei o Cebolinha há um mês agora é Professor Cebola. Tornou-se arbitro de futsal. Ele me falou neste último encontro que após derrubar o Helicóptero ele correu para casa e ficou dois dias debaixo da cama escondido e com medo da polícia.
    Grande abraço
    Marcos Falcon

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